terça-feira, abril 06, 2004

I

A palavra,
Por muito amada,
É reduzida, concentrada,
Vai diminuindo, diminuindo,
Até que, sumindo,
Vira pum.

O poeta,
Minimalista,
Para,
De boca aberta,
Sem movimento algum,
Admirado desse pum.

II

Pequeninas gotas.
Perfume da florada das macieiras.
Sons do mar.
Submarinos.
Acordando, uma tarde, sem sonho.
Poder gritar.
Casas recém-pintadas.
Comida com alho.
Seda.
Bico do seio.
Nada mais,
Nada mais,
Nada mais.


Voz esganiçada.
Gordura velha.
Falta de roupa limpa.
Silêncio que vem do medo.
Azul e marrom.
Perfume doce demais.
Nunca mais,
Nunca mais,
Nunca mais.

III

Eu queria dividir contigo
Alguns segredos que de vez em quando
Me chutam as canelas.

Mas eles fogem, miseráveis.

E me deixam com esse olhar parado,
Essa boca aberta.
Essa vontade de sumir, e,
Como eles,
Não deixar rastro.

IV

Eu ando emaranhado em milhões de teias,
Tecidas pela indescritível agonia
Do meu coração vazio.

Nenhuma pessoa pode perceber.
Não há nada que fazer.

E continuo tentando.
Nem sei de onde tiro as forças
Para olhar cada dia novo
E não desistir.

Nesse porão que chamo de casa,
Nesse inferno que chamo de vida,
Nesse desencontro que chamo desejo,
Tudo permanece quieto.

Mas, e se por um quase milagre,
Resolvo tentar, droga,
Mais uma vez tentar...

Só aumenta minha desilusão,
Minha dor.
Porque nesse jogo não existem vencedores.

Até quando?

Quem sabe é mesmo um problema de fabricação.
Mas, então, porque haveria o inventor,
De insuflar essa vontade nas suas criaturas,
As mesmas pobres criaturas
Que vagam loucas pela terra?
Por que desejamos tanto amar,
Se somos tão pobres de tudo?

Maldito seja esse senhor.

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