quinta-feira, abril 15, 2004

almatinal
bom dia,
como vai,
vai mal?

corpo falha,
voz de gralha,
leite talha,
cai na malha,
cornualha.
cornualha?

sono gruda,
me acuda,
manteúda,
só me iluda,
peço ajuda,
boca muda.

almatinal
alguma coisa
não é normal,
vida de vegetal,
tristeza abissal.

Nilo Neto

sexta-feira, abril 09, 2004

A minha pata sorrateira
esmaga o método.

Na dianteira
do mesmo eco, sou
seu som sem sê-lo.

A cada volta,
o ego estima
o jardim do óbvio.

Secante, tangente e
parábola da mente.

Vim, vi, desapareci.

A carne gangrenada
carrega o veneno,
em cada gota,
pela estrada
do meu desassossego.

terça-feira, abril 06, 2004

Amar de um amor sem nome.
Ter sorte sem ter destino.
Hoje começa, amanhã some.
Errar na conta do desatino.

Esse teu dedo, me aponta espelho.
Na vã palavra, o alvo é a arte.
O tal azul, numa gota de vermelho,
Completo, estou em qualquer parte.

Agora muda, corre pela calçada,
a mesma letra, prato quebrado.
Sem teu amor, a mesma alma cansada,
com tua luz, não tem dia errado.

Nilo Neto
Você me pergunta o que é amar,
eu respondo,
é sentir falta dos seus silêncios.
Aí você diz, mas afinal, de que serve amar
E eu respondo, a vida parece mais fácil.

Não preciso sofrer a ponto de não querer mais viver,
Mas estar longe é cansativo
E doloroso.

Ainda mais quando lembro,
De uma certa noite em que
Dançamos a salsa...
Sobre esse milhão de almas desperdiçadas, pelo medo do diferente, eu digo:
Parem com esse silêncio sem jeito.
Parem com essas janelas fechadas.
Deixem o canto invadir o dia.
Mas não me convidem para o enterro das ilusões.
Eu estarei vendo o mar.
E só em vê-lo, estarei feliz.
Deixem-me esquecer quem eu sou.
Nas terças-feiras, depois das quatro.
E aos que apenas sobrevivem,
meu mais profundo desprezo.
Por não estimularem o incomum em si,
e serem lentamente arrastados pela maré da adaptação.
Por mais doce que ela pareça,
é a morte da espécie,
que parou no sinal
e continuou parada quando ficou verde.
Sem passado nem futuro, a vida aqui no fundo dessa caverna seria calma, não fossem estas sombras estranhas que se formam, em certos dias mais luminosos. Sombras com contornos móveis, idéias sem dono que se acumulam, lentas, no espaço novo das curiosidades.
Tudo seria realmente calmo até que o desejo de compreender, dar um sentido ao movimento das sombras faz com que eu queira saber o que há para fora da caverna. Se eu soubesse o quanto há de inevitável e irreversível nisso tudo...
Agora estou sonhando com o silêncio da caverna. E há a saudade dos dias sem as sombras, quando só respirar era o suficiente. A felicidade antes da consciência da felicidade, hoje impossível.


Nilo Neto

São José,16/9/01
Se fosse possível colecionar esses momentos perfeitos...
A luz certa, uma música, um certo olhar, os cabelos emoldurando um sorriso. Ser feliz...
Quem sabe a arte também é essa busca. Esse eterno em poucos segundos ou minutos.
Queria retê-los por mais algum tempo. Por isso essas palavras, meu amor, pro querer tanto saber contigo desses momentos especiais escondidos em nossos cotidianos.
São como tijolinhos dourados escondidos entre os da parede da nossa casa. Nossos sonho secretos que, como passarinhos em busca de calor, finalmente fazem o verão chegar. Ou a primavera, minha linda, se assim mais te agrada.
E não queiras me falar em romantismo. Não trago em mim os grandes gestos ou lágrimas incontidas. Eu falo de uma certa suavidade, de tons pastéis.
Sei que era um fim de tarde. O carro corria suave sobre a pista cheia. Mas as janelas estavam fechadas e a música só, enchia nosso mundinho sobre rodas. E íamos não sei bem onde, mas o tempo passava sem pressa. E estávamos felizes. E essa felicidade parecia para sempre nesse momento cor-de-rosa. E mal lembramos de sorrir, porque estávamos completos, assim como nosso amor.
Se fosse possível colecionar estes momentos perfeitos...

Desterro, primavera de 98

nilo neto
Antes embebido no odor inebriante desta carne doce. E te peço que me leves desta lama, lodo, vida suja em que me mantenho. Este vício destrutivo de querer teu corpo. Ser sensual num tempo em que a sensualidade é crime. Um amante desesperado. Um pobre e rebelde coração, escravo sexual dos teus desejos mais sórdidos. Tem piedade de mim, mulher, e joga minha carne aos lobos, mas não me deixa aqui nesta mesa bebendo sozinho, fumando o último cigarro, entre o desespero e a suprema alegria de te possuir. Até derradeira gota de sangue, até o suspiro final.

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Tem certas coisas que eu preciso dizer, mas não sei como. Tem certos sentimentos que me vêm sei lá de onde, um vento sem janela aberta, um brilho de relance no canto dos olhos e eu fico assim, meio alegre, meio assustado. Aí suspiro. Profundamente. Querendo todo o oxigênio do mundo. E o meu olhar se perde num infinito do branco da parede. Eu me perco de mim.
Tem amores secretos que a gente lembra em certas noites estreladas. Que a gente queria ouvir grilos e sapos no meio da cidade. E caminha de mãos nos bolsos olhando para dentro das casas, esperando um sinal, um olhar revelador. Então a gente volta pra casa decepcionado e fecha a porta querendo fechar o coração.
Tem coisas sem nome esperando tradução.

S. L. 7/4/94

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Prestenção mulher

As loucuras que assim parecem, devem ser por nós vividas apenas como um contingência da beleza e do prazer, que a vida oportuniza ou proporciona, dependendo do que dela fazemos.
Peço-te que permitas.
Se houverem dores, que elas sejam mínimas, diante dos deslumbrantes momentos de entrega, delírio e caminhos ainda não trilhados, mas certamente descobertos com a delícia de um mundo novo.
Eu não serei o teu perfeito querer, mas que importa? Somos o que somos e sorrimos para o sol.

Desacato.
É assim que eu penso nela. Um cabelo de tal brilho, um olhar com uma felinidade, umas pernas que parecem dois coqueiros balançando numa praia paradisíaca, só vendo pra crer.
Só percebo um travo de amargura nas atitudes. Algo de rebelde sem causa, sei lá. Uma postura com excesso de autonomia, quase egoísta. Não há aquela gota de submissão que dá ao espírito feminino uma doçura peculiar.
Se eu me atrevesse a falar com ela, seria por mero exercício de autocomiseração. Ora vamos, tenho espelho em casa. Mas tenho também este papel e esta caneta. Então vamos às Loas, às Odes, que uma mulher destas merece um batalhão de poetas famintos e atentos.


S. L. 6-5-94
Nos teus peitos eu fico pensando, quando falo contigo. O tempo todo. É até difícil raciocinar. Qualquer dia tomo um porre e te confesso:

Teus peitos imensos...
Quero neles repousar.
Travesseiro de carne macia.
Quero beijá-los, tocá-los,
quero a memória tátil
para um dia eternizá-los
em argila ou poesia.

Teus peitos sagrados,
símbolo máximo da maternidade.
Meu reino, meu reino,
meu reino pelos teus peitos.

Avisto um calor intenso,
vejo uma mulher sensual
cheia de um fogo animal
e uns peitos maravilhosos...
Hoje foi um dia comum e cansativo. Alguma dor de cabeça, pouco prá pensar no amor. Fase cinzenta, entresafra, futuro pouco promissor. Estou colhendo o nada que plantei nestes últimos dias.
Eu me apaixonei mil vezes, por mulheres muito diferentes. Porque eram: lindas, inteligentes, experientes, maternais, intrigantes, sensuais, silenciosas, engraçadas, dançarinas, cheirosas, tudo junto ou separado. Amei uma vez. Não fui correspondido. Jamais esqueci. Mas fazendo um balanço, houve bastante diversão e muito prazer. Mas o que foi construído? Digo, e o futuro? Ah, o futuro que se dane, eu preciso é arranjar um cacho por aí. Só pra passar tempo. Aparece gata. Sai da toca e vem pro titio.
S. Leopoldo, 3/5/94
Moça Bonita

Por que és tão admirada pôr muitos homens, prefiro querer-te de longe. Não perceberás nunca o meu sorriso discreto, pedido na multidão. Mas eu estarei lá, naquela esquina, encostado numa parede, olhando-te, enquanto passas com teu séquito barulhento e deslumbrado. Teus gestos, tão estudados, tudo em perfeita sincronia, cabelos ao vento milimetricamente despenteados.
Todo este espetáculo me faz pensar, nas horas em que sozinha, ficas olhando a parede branca do teu quarto e vem aquele cheiro bom de café da cozinha. Lembras da tua infância, tão doce, pura e ensolarada. Toca o telefone, é um súdito clamando pela tua insubstituível presença. Aí, neste exato instante, pesa pra ti ser tão maravilhosa e tu só consegues desejar não ter nascido tão linda, só prá ser natural de vez em quando. Usar tuas camisas velhas, falar dos teus avós e do pé de carambola que existia na casa deles. Tu pareces ainda mais linda, quando estás assim melancólica, mas ainda não inventaram um espelho para ver a alma. Essa tua, que eu vejo, muito me encanta. Pena que a tua corte pouco saiba sobre ela.
Eu prefiro te amar daqui do outro lado da rua e rir destes segredos ocultos na tua solidão.


S.L. 20/09/94
Porque voce não consegue entender?
Porque você acha que esse é mais um jogo barato com a morte?’
Porque insiste me acusar de estar simplesmente fugindo, quando sabe que isso não passa de um velho artifício?
Quem sabe eu estaria melhor como um dos teu inúteis discípulos?
Quem sabe cheiraria melhor morto?
Isso tu só irás saber quando não for mais suportável ver o sol se diluir nas cores bizarras do fim do dia.
Isso tu só saberás quando meu nome se chamar saudade.
Sua inútil.
Insensível mulher.
I

Nas vezes em que fui menino,
teus olhos não me viram.
Sempre que fiz de conta que te amava,
não acreditaste no meu sonho.

Abri minha caixa mágica
para te dar uma alegria qualquer,
mas tu não sorriste.

Estavas o tempo todo tão séria,
estavas adulta e não brilharam,
para ti, minhas estrelas.

Então eu quis ser como tu
e encarei a vida cheio de responsabilidade
e frases de efeito.
Sorri quando não queria,
fui polido e acessível,
estendi a mão para todos os teus amigos.
Tudo restou inútil.

Hoje estás do outro lado do muro.
Eu te aceno, mas tu não vês minha mão.
Que pena ter sido assim.
Sinto saudade das tuas perguntas tão óbvias, sinto falta da tua moralidade mal disfarçada.
Foram anos loucos aqueles,
mas eu preferi ser o poeta
ao homem de negócios.



II
Tenho azia
e quero beijar teus pulsos.

Cheirar teu sexo,
beijar tuas orelhas.
Vaga nuvem de poeira em meus olhos,
depois vem a chuva.

Vou até onde tu estiveres,
mesmo com este calor infernal.
Sinto teu corpo sobre o meu,
tua alma que procura
o infinito.
Quero a tua boca
na minha,
tua saliva, quero o gosto da tua saliva.

Foges então...



III

Eu tive em minhas mãos
a matéria do sonho,
feita em carne
pela ilusão da felicidade.

Mas passou,
como passa a nuvem pelo céu azul.
E o sol continua a brilhar...

Marco o papel com a tinta,
mas como definir-te,
saber o que levas em ti, de mim ?

Assim como ainda tenho em meus dedos
o infinito prazer
do toque em tua pele,
será que teus poros
estarão cheios da minha energia ?

Uma grande interrogação,
detonando o meu tesão.

IV
Certamente,
tudo está relacionado com as infindáveis possibilidades de um encontro.
Ainda que me assuste a tua energia,
vou por este mundo crendo na tua luz.

Mas o que eu queria era te conhecer
bem devagarinho,
como se bebe um bom vinho.

Então quando eu soubesse de cor
cada possibilidade das tuas curvas,
eu me entregaria total e completamente
à força deste amor.

Porque eu estou cansado
dos segredos deste mundo
e tu certamente estarás sempre
muito além da maioria.

Mesmo que nunca,
mesmo que ainda... valeu.
V
Se tu me falasses da grande melancolia de viver,
mas tu me falas em sonho
e eu não sei o que te dizer,
porque não sei colorir o mundo
com os tons da alegria.

Por isso me calo e fico te olhando.
Ainda que eu saiba do medo
e dos estranhos caminhos do amor,
quando estou contigo
quase esqueço de tudo.
Mas prefiro voltar aos meus poemas
e à minha tristeza.
A solidão mora comigo há tanto tempo...







VI
Caminante
Acalanto,
momento de encanto,
invento.

A luz penetrante,
num breve instante,
contentamento.

Visões,
futuro desconcertante.
Caminhante,
há muitos caminhos.

Sozinhos,
a vida passou
sem levantes.

Tudo como era antes
S.L. 29/10/93

VII

Tudo em ti resplandece.
Os teus gestos se encadeiam,
dando sentido ao teu pensamento,
não ao que tu dizes.
Neste aparente contra-senso,
os segredos se revelam.
E o meu eu, em gozo, ri.

Se me olhas com malícia,
coro e calo.

Se tento falar, erro,
e me recolho ao nada de onde vim,
e de onde nunca deveria ter saído.

Em tua cabeça povoam
milhares de pensamentos.
Uns sutis, outros tão humanos,
mas todos te dão uma aura de sabedoria,
que provém da vida, da arte e do amor.

Tudo em ti resplandece
e eu me admiro de me achar digno
de estar tão próximo de tanta alegria

VIII

Aviso aos navegantes,
tudo como era antes.
Foi tudo miragem, diz o comandante,
não era nada ali adiante.

De repente a colisão:
lá se vai mais uma embarcação.
Assim é quando, desprevenidos,
vagamos pelo mar da emoção.
Tantos acidentes havidos,
nenhuma explicação.

Dizem uns, foi mera desatenção,
um olhar distraído na multidão.
E a nau sem rumo vai direto
chocar-se no mais sólido concreto,
para afundar então.

Nela vai meu coração,
soçobrando, sem salvação.
Vai feliz, o pobre iludido.
acha que tudo faz sentido,
na sua triste condição
de eterno apaixonado.

E eu ? Que fazer,
também morro afogado.

IX

Eu te espero na manhã que nunca vem e o sol nasce pra esmagar meu sentimento.
Enquanto ela brilha lá fora,
dentro de mim é tudo sempre tão escuro.

Quando a tua lembrança faz bater meu coração, é como se o sangue não fosse quente o suficiente para trazer vida à dor.
Não é só decepção, é também desesperança.
Mas tu ainda caminharás muito,
pisando nas flores que pacientemente
espalho pelo caminho.


Se ao menos me fosse dada a divina ciência
de ver os dias futuros
e se afastasse de mim toda a dúvida,
e eu apenas soubesse com a certeza do coração,
que o teu futuro fosse assim, tão brilhante,
tão doce e seguro, tão perfeito e tranqüilo,
que não restasse nada em mim além de paz,
quem sabe eu soubesse te esquecer
e pudesse viver minha própria vida,
parando de precisar me redimir perante o mundo, como se eu fosse o único pecador e tu, a única e autêntica salvadora.
Como pedir o teu perdão se nem mesmo me fizeste nada, além de estar ao meu lado, ouvindo meus queixumes e me amando do teu jeito estranho e louco.
Certamente os filhos que nunca teremos
estão se lamentando dentro de nós,
mas cuidar de outra pessoa é uma coisa tão séria que dá vontade de rir.


E agora mais uma vez tu buscas a dor.
Estás prestes a te enredar novamente
nas malhas graciosas e fatais do sentir
por quem não pode te dar um milionésimo
do amor que tu realmente mereces.

E eu mais uma vez me sinto cansado
como um velho no asilo que já viveu demais
e agoira espera pacientemente e calado pelo fim.
Vou mais uma vez me instalar no meu sofá
e esperar que tu venhas trazer
o teu banquete de decepções,
para que juntos saboreemos.
Até quando serei assim tão passivo ?

X

Um gosto de deserto na boca e uns óculos tão escu-ros que eu nunca mais precisasse ver o sol.
Enterrado na tumba da minha solidão.
Há esses tempos em que melhor seria
estar internado num hospício,
daqueles que usam eletrochoque,
pra deixar que a dor apagasse
qualquer vestígio do amor que eu sinto.

Amor cadela que lambe os pés
de quem o chuta;
Amor de sândalo
que perfuma o machado de quem o corta;
Amor de verme
que vive na escuridão pra fazer viver a terra.

Mas não, o papel de vítima me cai tão bem,
agora outra história vou encenar,
vou ser um cara esperto e sem escrúpulo,
vou afogar minha consciência num copo,
ou no corpo cheiroso de uma mulher bonita e burra, que engula minha falta do que dizer.
XI
Pinguei a gota de veneno no café
e vou bebendo suavemente,
deixando que meu corpo esteja
ainda um pouco mais quente,
pra minha hora de morrer.

A luz se vai apagando, eu sei,
nada estará resolvido,
mas ao menos o silêncio,
a cabeça parando de vomitar perguntas,
sempre mais difíceis, sempre mais fundo;

Chega !!!
A morte é o bálsamo dos desesperados
e hoje eu quero cantar a dor dos imortais.

“Alguma flor que perfumasse mais meu jardim, Qualquer nota que deixasse a música mais pro sim , que pro não de todo dia.
Uma nova luz, que jogada sobre mim,
Fizesse parecer que não tenho tantas rugas assim, Mas eu não saberia compartilhar esta melodia.
Seria egoísta outra vez,
Seria outro.”
S. L. 21/07/93

XII

A trip do destino:
vagar sem rumo,
como náufrago menino
no mar do mundo.

Avistar então a ilha,
após meses de solidão.
Será ela miragem,
será filha do desespero e da ilusão ?

Penso nisso enquanto te vejo chegar,
no mesmo bar,
bebendo quieto.

Teus movimentos entre as mesas,
fazem-me imaginar,
que és uma bailarina
e que danças só pra mim.

Serás tu a minha ilha,
ou lá vai mais um gole
pra esquecer a solidão ?

Nada mais um pouco, meu coração !!!

XIII

Eu queria encontrar palavras
que se adequassem perfeitamente a ti,
como um colar de pedras preciosas
que adornasse o teu pescoço.
Mas me fogem, aves vadias.
É o preço por te querer tanto
e à tua pele branca e macia.

A visão desse sonho,
que é beijar esse teu corpo todo
e trazer o teu perfume em mim,
tem o dom de me fazer fechar os olhos
e acordar num paraíso distante.

Mas tu me encantas e desapareces
como o coelho na cartola
e o aplauso do meu coração
afasta o medo,
mas não diminui a dor de achar impossível
o que talvez seja só delírio.

Eu queria encontrar palavras
mas só o silêncio traduz ,
o que é adorar-te como uma deusa da mitologia
dos livros sagrados do meu,
agora teu, coração.

S. L. 10/12/94


XIV

Caíram as lágrimas
de um santo,
numa capela branca, perdida
no meio de um bosque frio,
quando eu te perdi.

Porque moravam em mim
o medo, a dor e a solidão
e eu não sabia.

XV

Como falar-te de amor?
Como se sussurrasse nos teus ouvidos?
Como um longo beijo apaixonado?
Como uma oração silenciosa?

A vida te pôs aí, com estes olhos
cheios da genuína alegria,
este sorriso com a cor
das pérolas perdidas no oceano,
com tudo o que me permite
sonhar nos braços da poesia.

Agora eu te peço, não tenhas medo,
já tu és uma dádiva inestimável,
és como um segredo muito especial
e tu não precisas nada fazer,
senão deixar-te levar
pelo suave som das palavras de amor.

S. L. 31/10/94

XVI

Porque medir as palavras
se o que sinto é tão grande?

Eu te amo, eu te amo, eu te amo, Margarita
Rita dos meus sonhos,
Rita que saltita,
Flor mais que perfeita.

Assim que meu corpo acordar,
eu sei que minha mente estará ocupada
com a suave brisa do teu falar,
com os segredos da tua alma encantada.

Mas se me negas os beijos,
único alimento do meu amor carnal,
tudo parece tão cinza, não tem jeito,
meu dia fica estragado até o fim.

Porque, Rita, não voas e pousas,
no meu ombro firme?
Será que minhas virtudes são poucas,
para entreter teus olhos atentos?
Será que negas a ti mesma
a chance de ser feliz comigo,
por alguma culpa antiga?

Pois eu te digo:
Estás liberta do cativeiro,
pelo meu grande abraço amoroso.
E o teu sorriso mentiroso
não esconde a outra dor.
Nem precisaria.
É líquido e cristalino,
como a pura água do riacho,
que em teus pensamentos ainda existem
pequenos cacos do amor que se quebrou.
Eu não te peço que o esqueças!

Quero apenas ser o outro dia,
o dia seguinte, onde
flores nascem das pedras,
como as doces margaritas.
Quero ser o teu Jardim Secreto,
o teu renascer das cinzas,
a fênix do grande amor vivido.

Sei que posso, sei que quero,
te dar mais alguns dias
de felicidade neste mundo.

É pedir demais então,
que mergulhes neste sentimento,
como no dia quente
em que o mar refrescou teu corpo?
Não, Rita, não é.

“Deixa de ser boba e vem comigo,
Existe um mundo novo e quero te mostrar,
que não se aprende em nenhum livro,
basta ter coragem pra se libertar,
viver e amar...”

Por tudo isso,
quero o teu beijo
e todas as delícia que o teu corpo
pode proporcionar.

S.L. 23/3/95



XVII

Vínculos fanáticos de desejos incontroláveis,
Pele rasgada, alma fendida,
Meu falo de aço abrindo a ferida.

XVIII

Fumaça de cigarro
subindo pelo poço de luz,
sinal índio,
reclamando a tua presença.

Ela deve estar dormindo.
A noite foi longa,
sons e luzes,
dança e prazer,
entre os cigarros dos outros,
goles amargos que fazem esquecer.

Acorda, meu amor, acorda,
deixa a tua cama e vem me ver,
não agüento um dia cinza,
sem a cor dos teus olhos.


Fumaça subindo pelo poço de luz,
e a mente vai com ela,
até os braços da minha amada.

S. L. 24-3-95

XIX


Eu rasguei meus olhos
pra não ter que ver
seu lado mais escuro.

Irmã do mal,
adeus.

Não sei o que esperar da vida,
mas sei o que me faz infeliz.
Por isso não me venha
com as doces palavras da ilusão.

Só estou aqui sentado,
esperando a vida passar.

Irmã do mal,
adeus.

Você sabe que está caindo
no abismo da solidão,
mas se o seu salvador
sumiu na hora H,
esqueça que me conheceu.

Irmã do mal,
adeus.
.................................

Agora que tudo clareou,
que a chuva já passou,
fiquei aqui pensando,
quanto ainda estarei,
enganando a mim mesmo,
por que se a felicidade existe,
ela não rima com teu nome.

Você busca chamar a atenção,
de uma forma rude e tola,
porque se é certo que te amei,
já sei como te esquecer.

Irmã do mal,
tudo o que so-nhei,
e você insistiu em quebrar,
vai ficar espalhado,
nos dias azuis do passado.

Fui teu, irmã,
hoje não sou de ninguém.

Laguna, verão 95

XX

Sei lá, milhões de vezes sei lá,
porque se sentido não há,
muito sentimento desceu pela descarga.

Some o sol, vem a lua,
some a dor, vou pra rua,
pescar estrela, beijar cigarro.

Tiro um sarro
da tua falsa solidão,
doce ilusão,
descendo pelo vaso.

Arraso,
mas não sinto pena.
Não sorrias, pequena,
tudo foi em vão.

Desperdício de sorriso.
Cabe dor neste coração?
Acho que não te preciso.

Mais, quero mais,
como o mar sob o cais,
tento derrubar a base.

Quem sabe a gente se case,
quem sabe não.
Depois vem a separação.
Os filhos na casa da mãe.

Minha vida não vale nada
e vai descendo pela privada.

Vida inútil, tudo some,
essa febre me consome
e não tem remédio.

Te amar, ah que tédio!
Quero é sofrer
pra depois te esquecer.

S.L, 2-4-95

XXI

Eu cuspo na tua boca
e tenho consciência do desperdício.
Teu lugar é no hospício
pra humilhar as loucas.

Dou um talho no teu peito,
jogo sal na ferida.
Mas não tem jeito,
pra ti não tem saída.

Não pensa, que fede,
enche a boca de tequila.
Tua maldade não se mede,
teu veneno não destila.

Se pensas que estou só,
te enganas redondamente.
Não preciso da tua dó,
longe de ti estou contente.

A vida não tem graça
sem um pouco de amargura.
Hoje é o dia da caça,
hoje eu encontrei a cura.


S.L, 2-4-95,


XXII


Se eu te beijo a boca
antecipo o carnaval
e saio por aí vestido de arlequim,
palhaço ou pirata.
Faço no céu uma chuva de prata
e tanto barulho que acordo a cidade.

Seria a máxima felicidade,
encontro de uma nave louca
que chega a um destino maior,
se eu te beijo a boca,
ah, nem sei,
acho que nunca mais passo água,
vai se embora toda a mágoa
e fica só o mais bonito,
aquilo que eu acredito,
um beijo da mulher amada.

Lg 18/1/95

XXIII


Existe este mar imenso,
verde escuro,
refletindo as pesadas nuvens,
cinzentas, cor de chuva.

Há também um vento frio,
lembrando a distância dos trópicos.

Aí toca um blues tão triste,
tão bonito
e eu fico aqui saboreando a saudade.

Sei que a tua cidade não te deixa sonhar,
os prédios afastam a ilusão
e esmagam com a verdade do mundo.

Sei de tudo isso.
Só não sei como te consolar,
só não sei como te fazer sorrir.

Estar aqui contigo já seria um bom começo.

Lg. 13/2/95

XXIV

Lá longe, onde as multidões não alcançam,
está um coração atormentado,
mutilado por uma dor,
insuportável e inevitável.

Que diabos ele fez,
para estar assim,
roto e esfarrapado,
resto do resto,
fio do trapo mais sujo ?

Quem não teve consideração,
quem o deixou pelo caminho,
quem não soube ser compreensiva?

Mas ele não está consciente,
o pobre coração está morrendo.
Livra-o da dor do fim,
a mão de quem o criou.
Está entorpecido pelo álcool,
pelas outras drogas, pela dor.

Não vê, não ouve,
não sente pena de si mesmo.
Só quer mesmo morrer, dormir.

Adeus amor, eu vou partir,
tudo está acabado,
nada mais faz sentido.

Adeus coração, adeus.

XXV

Vejo a brasa do cigarro,
que fumo,
na escuridão do quarto
e deixo minha mente vagar...

Em que curva meu coração se perdeu?
Que olhar, que perfume,
fez dele um tolo, que perdeu o rumo
e capotou.

E agora coração ?
Viver sem ela?
Insistir sem a menor dose de segurança?

Não, já foi.
E começar tudo de novo.

SL 9-4-95



XXVI

Eu me acordo
como o desprezo de um passo em falso.

Dança, movimento do corpo,
força que, impulsionada pelo sensual,
faz a alma falar em silêncio.

São pássaros, são ventos,
que as tuas mãos em movimentos
fendem no ar parado.

Quando a arte imita a vida,
tudo passa a ter outro sentido.
Sinto-me comovido,
sorrio aprovando tudo.






XXVII

A minha voz anda rouca do cigarro,
meus olhos fundos da falta do sol,
só a noite e a tua voz.
Vivo alimentado por uma ilusão.

Quem sois vós, irmã querida?
A que lugar me levas,
carregando-me pela mão?
Três minutos de silêncio pela noite que morre.
Te levo até em casa e vou dormir sozinho,
outra vez e outra vez.

Se faz sentido?
Não sei, gosto da minha vida.

Fim de tarde na cidade.
Sol e multidão.
Frio.
Lenine nos ouvidos:
“É mais alem...”

Ainda me oprime
Estar entre estes humanos,
Testemunhas das minhas quedas,
Mesmo que não saibam.

Caminho entre espelhos,
Que mostram sempre o mesmo.

Só quis ser andorinha
E sobrevoar toda essa dor.

Desterro - 28 de Junho de 2002



Medo e raiva.
Raiva e medo.
Duplinha eficiente.

Nem lembranças.
Nunca aconteceu.
Sofrer por que?

A noite vai em frente.
Sempre será assim.

Medo e raiva.
Raiva e segredo.
Trio fatal.

Estrebucha coração.

Desterro - 28 de Junho de 2002








Vai mulher, anda.
Carrega esta cesta cheia de espinhos
Pra bem longe daqui.

Onde foi que vi
iguarias e bom vinho?

Quem éramos, hipnotizadora,
quando fui me perder no teu olhar?

Despertar.

A dura lucidez destes dias,
parece que ainda vai me fazer desaparecer,
sob as águas.

Essa dor.

Esquecerei?
Melhor,
não terá mais importância.

Só não queria errar de novo.
Cair no mesmo velho truque da mulher-problema.

Que mudasse
ao menos:
o cenário,
o figurino,
ou o palhaço.

Desterro - 28 de Junho de 2002
XXVIII


Meu chapéu de Indiana Jones,
fumando um Marlboro,
bebendo uma Budweiser,
ouvindo Kiss, do Prince.

Sou brasileiro, engraçado,
não sei que cultura me ensinou
a ter esta cara de cowboy aposentado.


XXIX

O suor da tua testa,
palavras que a dança escreve,
usando teu corpo como papel.

Quando tu danças,
embarco na nave que parte
rumo ao planeta sexo.

Somos filhos do prazer,
fugindo da dor,
brincamos de felicidade.

R. P. S. , tudo o que não sei,
vivo querendo aprender contigo,
prá esquecer logo depois.

Engraçado como a vida é pendular,
e a felicidade só,
não movimenta essa roda infinita.

S. L. 5-4-95

XXX


Poema do ciúme fundado.

Ai, meu amor,
sem a doçura dos teus beijos,
estou fadado
a morrer de fome.

Mas eu te quero só prá mim.
Não sei te dividir,
não quero um pedaço,
é tudo ou nada.

Ai, meu amor,
sem o calor do teu abraço,
estou fadado
a morrer de frio.

Mas no inverno da minha vida,
tens o cobertor exato
para o tamanho das minhas noites.
Se puxas um pouquinho,
fico como sem.
É tudo ou nada.

Ai, meu amor,
sem a certeza das tuas palavras,
estou fadado
a morrer de tédio.

Mas se mais alguém te ouve,
é como se eu desaprendesse
a falar tua língua
e fosse morar num país estranho.
É tudo ou nada.

Mas se o teu tudo é a vida
e o teu nada, a morte,
aprendo que sem ti não tenho saída,
e sou carregado pelos dias,
como a terra pelo rio,
até o mar.

Sem vontades,
sem vaidade,
só o destino
e a solidão.

S. L. 10-4-95


XXXI


É como se alguém morresse
e não houvesse mesmo justiça no mundo.
A que deus elevar preces e lamentações ?

É como o frio do outono
e a gente sempre veste roupa demais
ou de menos.

É acordar no outro dia
e só ter como companhia
uma vaga dor de cabeça sem motivo.

É ganhar umas flores muito lindas
e não ter em casa
um vaso bonito onde colocá-las.

Assim é essa sombra de vida,
longe do teu sorriso.


XXXII


Eu sei da tua dor.
Não sei como curá-la,
mas estou aqui,
como a mais humilde
das criaturas de Deus,
esperando e crendo
que tu saibas aprender
com toda essa situação.

Aguardando
que tu venhas beber
na fonte secreta do meu coração,
a água cristalina
da paz e do amor
que dedico a ti,
flor única da minha vida,
pessoa que vê em mim
um homem melhor,
que sabe vencer em mim
as barreiras que os sofrimentos,
solidificaram nestes anos de solidão.


Eu sei da tua dor,
eu acredito em ti.
Nas horas em que dói mais estar vivo,
é bom saber do teu sorriso.
Nos momentos em que não penso em ti,
realmente não estou pensando,
estou só sentindo
toda esta maravilha
que é estar com a minha alma
bem pertinho da tua.

Eu sei da tua dor
e sei de muitas outras verdades
que fazem parte da tua vida.
Verdades que jamais te poderei dizer,
porque elas não encontram nas palavras,
um meio de expressão autêntico.
Rita, sei do tamanho da minha babaquice,
sou uma criança grande, eu sei,
habitam em mim ela e um velho,
que estão numa discussão eterna.
Mas acima das minhas possibilidades,
está um eu mais que perfeito,
que me carrega nos braços,
quando sinto que minhas pernas
estão para fraquejar.
E eu gostaria que tu também
soubesses deste teu eu maior,
que jamais te abandona,
porque tu também,
és filha de uma fagulha divina
que caminha rumo à perfeição.

S.L. 12-5-95
XXXIII


Sinto que por mim passam,
como pela janela, o vento,
banhos de uma energia suave,
com cheiro de jasmim,
e o poder transcendente,
das forças poderosas do amor.

Vai, minha amiguinha,
vai sorrir pros homens sós,
vai procurar em caminhos secretos,
cachoeiras perdidas,
em florestas escuras.
Não deixa que a tua lágrima
mate a tua sede de amor.
Existe a solidão
só pros que não sabem
amar se dando
e tem medo
de sentir medo.

Eu fico aqui te olhando,
com esta cara de quem
descobriu a solução.
Mas eu não tenho nas mãos,
mais que uma verdade nua, frágil
e tremendo de frio.
É essa verdade tristinha
que não me faz desistir.
Ela é esse sentimento,
muito maior que o mundo.

Se eu tivesse asas
prá viajar te carregando nos braços,
certamente conhecerias
meu lugar especial
e lá tu serias tão insuportavelmente feliz.
Tanto que te esquecerias a saudade
de um dia ter sofrido.
Mas isso é sonho e
aqui a vida é crua.

Somos todos filhos do mesmo engano, mana,
porque Deus estava de porre,
no dia em que criou a humanidade.
Por tudo isso,
eu deveria ser o mais amargo,
o mais cético dos homens de bem.
Mas toda a minha incredulidade cai,
quando descubro em mim,
aquele pedacinho que é teu,
e que tem sempre flores sorrindo,
nos canteiros das janelas.

Tudo já está escrito
e o homem segue lutando.
Então por que eu estaria quieto ?
Se na minha cabeça
existem mil cidades secretas,
cheias de mistério e solidão,
mas carregadas de sonhos...
S.L. 12-5-95

XXXIV


Existe um porto distante,
esquecido em mapas medievais,
no meio de uma capela branca,
dentro de um bosque escuro.

Neste porto mora um homem,
que traz nos braços as marcas do mar.
Nos ombros caídos e olhos enrrugados,
uma vida rica e aventurosa.

Mas esse homem escolheu este porto
entre todos os outros do mundo,
porque queria esquecer
um rosto que viu um dia,
numa cidade qualquer do hemisfério sul.

Num lugar estranho,
com tabernas e árvores,
e uma gente cheia da loucura de Deus:
Poetas, pintores e bailarinas;
Bêbados, drogados e prostitutas;
Santos, mártires e bruxas...
Todos convivendo numa harmonia
estranha e surpreendente.
Pois foi neste lugar,
que tinha lindos poentes,
num vale verdejante,
que o marinheiro cansado
encontrou a musa mais que perfeita.

Ela surgiu como numa aparição
e tomou conta de tal forma,
do coração daquele aventureiro,
que ele não teve mesmo como defender-se,
como proteger sua alma vadia
de velho lobo do mar.

Ele entregou-se como pode,
por que a vida havia lhe deixado
muitas marcas dolorosas
e ele não sabia ser doce.

Mas com suas mãos calejadas,
tentou mostrar àquele anjo,
que ainda havia nele
uma pontinha de esperança,
de se acomodar e ter uma família.

E finalmente ancorar
seu coração de homem sem destino,
que nunca fora de ninguém.

Porém esta mulher perfeita,
levou consigo o segredo
e o amor do homem,
que ficou tão só,
tão miseravelmente só,
que ele então se exilou,
no porto onde ninguém,
senão as cacatuas,
visitavam-no anualmente.

Existe para todo mundo,
este porto distante...

S.L. 12-5-95

XXXV


Queria ficar preso contigo no elevador.
Sentir-me angustiado, asfixiado
e me aninhar nos teus braços.

XXXVI

Chutei tua canela sob a mesa.
Palavras difíceis que disseste aos meus amigos.
Como é boa esta intimidade de casal.
Em casa vou ter que dar explicações.

XXXVII


Carência demente,
caminhos paralelos,
visão da janela.

Passei pelo ponto,
seguravas a mão da criança,
sorrias para ela.

Passei e assustado
olhei para ti.
Paixão relâmpago,
chamusquei o banco,
esquentei o ônibus,
queimei de amor.

Tudo em vão.
Jamais saberei teu nome,
teu perfume preferido,
aquele livro que uma amiga indicou
e tu nunca leste.
O grande amor da minha vida pode estar me esperando.

XXXVIII


Augusta flâmula bramida inutilmente,
nas policromáticas tardes caniculares.
O dinheiro é como um praga que,
acompanhada da dor,
persegue o homem em sua jornada
na busca de si mesmo.
Como o cão e seu rabo,
que nunca se encontrarão.


XXXIX

A vida está acesa em cada sorriso,
nas ruas onde o sol já se foi,
mas ainda não funcionam os postes.

É aquela hora mágica
quando se calam os passarinhos
e o velho pára de balançar a cadeira,
sem saber bem porquê.

Há uma reverência no ar.
O dia se despede num céu de fogo.
A noite se apresenta num azul escuro,
cor de infinito.

Eu só penso nos teus olhos
e em como só um Criador inspirado
teria feito um mundo tão lindo,
teria feito a ti, tão maravilhosa
e a mim, para sonhar versos
como quem respira amor.

s.l. 18-4-94

XL

Quanto tempo perdido
por medo de dizer sim.
Quanto orgulho na lata do lixo,
mais tarde.

Se o beijo apaixonado passou longe
e nunca mais voltou,
porque não brincar de amanhã
e aceitar todos os temores.

Sorrir?
Tento não chorar.
A vida tem sido boa.
Há os dias em que a chuva
molha meu rosto sem lágrimas.
Ainda outros em que o cachorro do vizinho
late para um gato imaginário.
A TV cospe a nova moda de Paris,
ou visto uma camisa limpinha, com cheiro de sol.

Vê agora que toda aquela agonia
não passou de nuvem passageira.
Ela está muito satisfeita com a última ficha
no orelhão da esquina:
- Adeus querido, a gente se vê por aí.

S.L. 10-9-94
XLI


Ontem, se eu soubesse amar,
tua flor faria de mim um poeta.
Mas sabê-la entre nós, perfumada,
já foi capaz de transformar
um momento silencioso
num poema de mil palavras.

Nunca saberemos ao certo
o que aconteceu naquele instante
e nossos netos não poderão identificar
em nossas rugas e cabelos brancos,
as marcas sutis que o tempo não desfaz.
Quando um homem, uma mulher
e uma flor desabrochada
comungam a maravilhosa harmonia
da natureza perfeita e acabada.

Guardei aquele momento
como a uma jóia preciosa
no cofre das saudades.
Quem sabe assim a felicidade
lembra de me visitar.

S. Leo 13-5-94



XLII




Apenas mais um segundo,
deixa meu amor vagabundo
querer a tua boca.

Quem sabe o tu calor
acabe com o torpor
da minha alma louca.

Imagina o que uma rima boa
faria por um amor assim.
Pequeno poeta sou, pobre de mim.

Nas palavras sou ruim, confesso,
mas é pouco o que te peço.
Esquece este poema à toa,
lembra do que sinto.


XLIII




Como falar de amor
se o que recebo são migalhas?
Se a amizade é motivo de paz,
falta ao poeta força para escrever,
falta paixão.

Não há justificativas para o sentimento,
ou se tem, ou não se tem.
Por isso não me rebelo
ante o teu jugo.

Mas sofro.
Desejo muito mais.
Penso que não devo,
porém sinto-me injustiçado.

Afinal, o que são uns beijinhos,
prá quem tem tanto amor transbordando
em cada gesto mal disfarçado?

Que caia o véu mulher.
Vem pros braços do teu urso de pelúcia,
quente e autenticamente amoroso.

S. L. 14/5/95

XLIV

Vai coração,
Indica por onde anda minha amada.
Vai que eu aqui espero ansioso,
Iludindo as horas de saudade
Abraçado numa garrafa.
Não há distância que nos separe,
Embora a solidão me assuste.


Você é a única
Ilusão de amor que
Carrego sem medo.
Apesar de preferir seus beijos.

Valeram aquelas palavras, mas
Ignoravas meu olhar, eu sei.
Coração quando quer falar
Arruma qualquer discurso ensaiado.

XLV


Agudo é o grito,
mas da boca não sai nada.
Perdi o prazer de dizer teu nome.

Toda vez que eu te penso, chove.
É mesmo assim que a natureza chora,
desde que as minhas lágrimas secaram.

Porque não consigo te esquecer?

A louça quebrada na cozinha.
Da torneira, só o vazio.
A casa perdeu as cortinas e os passarinhos.
Só eu fiquei aqui olhado pra saudade.

Lembro os teus pequeninos gestos,
colocando nos lugares certos,
cada lembrança.
Agora que o sonho se foi
restamos eu e o pó,
mais a vontade de ser outra pessoa.





XLVI



Enebriado pelo teu suave movimento,
caminho trôpego por ruela esquecida.
Quem me olhar nos olhos não me encontrará,
sou apenas um corpo com alma perdida.

Minha face não esconde o amor que sinto,
em cada gesto transmito esta alegria.
Perdi meu eu, sou só pensar em ti,
tu és minha luz e toda minha sabedoria.

E se és assim, mulher amada que vive em mim,
eu faço verso, orgulhoso de minha missão:
és minha musa, sou teu cantor.

Se com o tempo, tudo tem um fim,
o nosso não há de ser esta canção,
mas uma infinitude de palavras de amor.

S.L. 5/10/92





XLVII



Pretenção mulher

As loucuras que assim parecem,
devem ser por nós vividas apenas
como uma contingência da beleza
e do prazer a vida oportuniza,
ou proporciona,
dependendo do que delas fazemos.

Peço-te que permitas.

Se ouverem dores, que elas sejam mínimas
diante dos deslumbrantes momentos
de entrega, delírio e caminhos não trilhados,
mas, certamente,
descobertos com a delícia
de um mundo novo.

Eu não serei o teu perfeito querer,
mas o que importa?
Somos o que somos e sorrimos para o sol.





XLIV



A terra cansada do teu andar
O mundo cansado do teu olhar
A pele cansada de não tocar
O sorriso cansado de te esperar



XLV

Enebriado pelo teu suave movimento,
caminho trôpego por ruela esquecida.
Quem me olhar nos olhos não me encontrará
sou apenas um corpo com a alma perdida.

Minha face não esconde o amor que sinto,
em cada gesto transmito alegria.
Perdi meu eu, sou só pensar em ti,
Tu és minha luz e toda a minha sabedoria.

E se és assim, mulher amada que vive em mim,
eu faço verso, orgulhoso de minha missão:
és minha musa, sou teu cantor.

Se com o tempo, tudo tem um fim,
o nosso não há de ser esta canção,
mas uma infinitude de palavras de amor.

Ei, humana,
Ouve esse grito insano
Esse grito surdo,
Absurdo,
Irreal e permanente.
Que cala e consente,
Com tudo o que existe.

Com o que persiste
E se deixa levar,
Onda na sombra do mar,
Vesgo, inseguro e secreto,
Leve como concreto,
Tudo de bom?

Aja nesse meu som,
Nesse resto de força,
Nessa velha canção,
Ouvida desde o começo,
Nesse meu esquecido tropeço,
De cavalo pastando.

Esse que está relinchando,
Quando você dorme tranqüila,
Esquece que já foi outra.
Do tempo que nunca passa,
Nesse continuum sem fim,
A flecha que já não caça
Outra peça de museu.

Esse que já fui eu,
Agora só, fica me mirando,
Quando não estou te olhando.

Ouve esse outro grito,
Ouve que te permito,
Estar somente parada.
Quieta, esperando a chuva,
Fim de tarde que nunca acaba.
Chega mais perto para saber.
O que não me cabe esconder,
Serei capaz de esquecer?

Mesmo que em mil anos,
Mesmo que desumano,
Sei que pretendes o mesmo.
Uma vida desperdiçada,
Uma outra, mesma, calçada,
Pisada, mil vezes pisada,
Que nunca leva a nada.
Que nunca deixa de pedir,
Para ser atravessada.

Vai maldita,
Leva meu isqueiro,
Leva minha seda,
Leva meu segredo,
Eu te espero nesse degredo,
Só me resta te desejar.

Mais um gole,
Mais um dia,
Lenta e perfeita agonia,
Lua cheia de saudade.

Essa é a realidade.

Pouco me resta,
Mas estou vivo.
Irremediavelmente vivo...

Espero o teu sinal.

Nilo Neto

Não me leve a mal.

Só rindo,
Sou lindo.

Sou riso.
Sol liso.

Sol do meu quintal.



Nilo Neto

Desterro
25 de Outubro de 2002

-------------------------

Poemindo,
Poemeu.
Acho que ele nasceu.

Poemeu
Poemorto
Acho que nasceu torto.

Poeminto.
Poemargem.
Desgraça pouca é bobagem.

Depois de lido, Poemeu,
Toma que esse filho é teu.

Aos meus amigos que tem lido poemeus através dos anos.

Nilo Neto
Desterro, 25 de Outubro de 2002.




I

Silêncio azul
Neste pleonástico Ingleses da ilha.
Revoam palavras
Sobre galhos e sombras
Procuro uma paz qualquer.

Quero que nasça um pássaro em mim.
Quero que surja mas não sei bem como
Estimular para que saia do ovo.
Não sei bem chocar.

Desajeitadamente caminho.
Dou voltas no ninho, ansioso.
Espero que quebre a casca
Com sua própria força
Criativa e transformadora.

II

Para a Senadora Heloísa Helena

Contamina-me com tua palavras.
A velha dor domada pela coragem
De permanecer lutando
Quando qualquer resultado
Parecia impossível.

Contamina-me com tua beleza,
Mulher que brilha no firmamento
Da honestidade e da ética.

Contamina-me com teu olhar.
Força tão presente
Que põe fogo à sarça
Dos meus últimos temores.

III

Não que me caiba
especificamente
este inferno ou outro qualquer.

Roer unhas,
Fumar ou
Chupar picolés compulsivamente,
Jamais fizeram parte
Da minha definição de felicidade.


Nilo Neto – Ingleses, 23-06-03
Pode ser
que eu custe aceitar
a construção dessa vã teia.
Que me incendeia.

Esse teu olhar,
que me mergulha
num fogo profundo,
Ainda que hoje infecundo,
Um dia vai me salvar,
Eu sei.

Hoje tens um castelo sem rei.

Amanhã talvez,
Quem sabe outro destino.
Quem sabe a minha solidão
Segue na lava desse vulcão.

O Olho do Farol

O desmilingüido amor
Que contigo não vivi,
Está por se acabar,
Se ainda não acabou.

E o que dele restou,
Não tem utilidade.
Um certo sabor saudade,
Uma dose de estricnina.

Detalhe:
Piscando pela madrugada,
Semáforo de um cruzamento
Que há muito não vê
Carro
Nenhum.

Finado amor,
Aqui jaz
E já tanto faz
Que por ele se chore
Ou dele se esqueça.

Vê se sai da minha cabeça!


Nilo Neto
Desterro
11-10-2001

Nota: Encontrei, no Houais, o termo desmilinguido ( com u tremado), como verbete “regionalismo”, significando sempre, arruinado, finado, fraco, magro, etc.
Não consegui encontrar o termo intanguido, por isso, eliminei-o. NILO FILHO
2-12-02
Nem que fosse te interessar,
Mas estou despedaçado.
Estou de volta à falta de sentido.
Estou sem futuro.
Minhas asas, inúteis nos vôos pequenos,
Lentamente atrofiarão.
Não tenho mais um sonho
A que me agarrar durante a tempestade.
Nunca soube amar.
A pobre ilusão desceu pelo ralo
Do cotidiano amargo,
Dos dias acinzentados,
Absolutamente iguais.
Amontoado de fatos banais.
Ruiu a ínfima construção
De tijolos esfarelados
Pela impossível realidade.
Aguardar a senhora dona morte,
Volta a ser a torturante espera.
Gota a gota.
Até que o vaso transborde,
Caia e se parta.
Para que, então, desapareça de vez
Esse meu eu tão cansado.

Ingleses, 20-12-02




Não me leve a mal.

Só rindo,
Sou lindo.

Sou riso.
Sol liso.

Sol do meu quintal.



Nilo Neto

Desterro
25 de Outubro de 2002
Meu coração exaltado agita-se,
Ante a visão inesperada
De insepulta dor.

A que se deve tal renascimento,
Que cruel realidade mal dissimula,
Esse outrora cordato companheiro,
Hoje, mais que bater, inconformado pula.

Não sabia, por mais anestesiado está,
não suportaria mais essa atrocidade.
Emaranhado nos labirintos da saudade,
Pôs-se a lamuriar pela amada do Ceará.

Mil vezes maldito sentimento que não morre.
Vai-te de mim, quero dormir sem chorar.
Quem sabe noutra vida possa um dia estar,
Ao lado dela, que hoje longe, não me socorre.
CAMUFLAGEM


Hoje o preconceito veio bater na minha porta.
E eu achava que vinha de uniforme,
Fazendo carrancas e ameaças, aos gritos.

Ledo engano.

E me doeu bem mais,
Porque o preconceito veio
De camiseta e calça desbotada.

Vinha com uma fala doce.
Dizia coisas
Que me faziam lembrar um aliado compreensivo,
Disposto a ouvir e não julgar.

Disfarçado de companheiro,
Ele me deu a rasteira
Bem na hora do salto.

O preconceito veio camuflado
No meio de um grande amor.

E mais uma vez caí.
Mais uma vez me condoí de ser,
Eu também,
Humano como ele.

Hoje o preconceito bateu na minha porta
E eu o convidei
Pra entrar na minha casa.

Com um sorriso de velho amigo,
Ofereci um café, passado na hora.

Minhas armas depus
E com ele partilhei
Meus sonhos mais secretos e delirantes.

Ele então me abraçou e disse estar comigo,
Para os momentos de alegria e desespero.

Ai dos que, como eu,
Lutam por um outro mundo,
Tolerante e solidário.

Sim,
Andará comigo
Por muitos e muitos anos.

Agora que aprendi:
O preconceito mora dentro de mim.


Nilo Neto

Floripa, 8 de agosto de 2003

Eu preciso aprender logo
A soltar esses grampos que me prendem
Os cabelos
Ao passado,
Aos gostos do passado,
Aos sorrisos do passado.
A esse outro eu tão incrivelmente,
Invencivelmente
Medroso.

Caverna, útero, canto escuro.
Calor, proteção,
Tudo o que agora me falta.

Agarrado que nem chiclete quente do asfalto,
Na sola do tênis preferido.
Para sempre.

Essa é a visão do inferno do passado.
Onde o velho chifrudo irresponsável,
O canhoto, o tranca-rua e o sete-encruzilhadas,
Riem às gargalhadas,

Desse teu escravo!
Que grita pela milionésima vez:

Meu único e verdadeiro amor,
Irremediavelmente engolido,
Pelos segundos infindáveis
Em que não estamos juntos,
Ou seja, minha vida nesses últimos anos,

Anda logo vem de volta pra minha vida e
Varre com a tua alegria cheia de olhares doces,
Esse outro passado que nem me abandona,
Nem me deixa morrer em paz.

Esse sotaque mané,
Sempre é,
Confuso e divertido.

Agora o pobre do mané,
Nunca é
Bem compreendido.

De alma simples,
Eu venho de um povo,
Que gosta de comer
pirão dágua com ovo.

Metido a malandro,
falador e mandrião,
O mané pescador,
tem o mar no coração.

Ascali foi us istepô
Cacicô a bucica purriba dimim,
Sacuse, sacuse,
Que acarqueto a mão purriba
Do zóio dum
Carreviro


Como convém, sumi.

Deixei o rastro,
sem cor, nem cheiro,
pela constelação da ursa maior.

Vácuo da saudade.

Disfarçada de raiva,
lá vai a velha lesma.
Largando muco pelo chão.

Choramingando,
se arrastando.
Lógica de lesma é:
sofrer e reclamar e chutar e ferir e sofrer e reclamar.

Muco da vida igual,
sem chance de sair do labirinto.
Ela que nem sabe, que não tem saída,
vai pensando que é assim mesmo,
pela estrada,
pela vida.

Eu, hein! Acorda lesminha.


Nilo Neto


Bukowksi

O que os escritores fazem quando não estão escrevendo? Eu vou ao hipódromo. Nos meus primeiros tempos, ou passava fome ou trabalhava em empregos de revirar o estômago.
Agora, me mantenho afastado dos escritores — ou das pessoas que se dizem escritores. Mas entre 1970 e 1974, quando decidi ficar em um lugar e escrever ou morrer, os escritores vinham aqui, todos poetas. POETAS. E descobri uma coisa curiosa: nenhum deles tinha qualquer meio visível de sustento. Ou, se faziam leituras de poesias, poucos assistiam, digamos de quatro a 14 outros POETAS. Mas todos viviam em apartamentos razoavelmente bons e pareciam ter tempo de sobra para sentar no meu sofá e beber minha cerveja. Adquiri fama na cidade de ser o maluco, de fazer festas onde coisas inomináveis aconteciam e mulheres doidas dançavam e quebravam as coisas, ou que eu expulsava as pessoas da minha casa, ou que havia batidas policiais ou etc. e etc. Muito disso era verdade. Mas eu também tinha que escrever para meu editor e para as revistas para conseguir dinheiro para o aluguel e o trago, e isto significava escrever prosa. Mas esses... poetas... só escreviam poesia... eu achava que eram superficiais e pretensiosas... mas eles continuavam com ela, vestiam-se razoavelmente bem, pareciam bem-alimentados, e tinham todo esse tempo pra sentar no sofá e tempo pra conversar — sobre sua poesia e sobre si mesmos. Muitas vezes, eu perguntava: “Escute, como você se sustenta?”. Eles só ficavam sentados, sorriam para mim, bebiam minha cerveja e esperavam que alguma
das minhas doidas mulheres aparecesse, na esperança de que, de alguma forma, conseguissem um pouco de sexo, admiração, aventura ou seja lá o que for.
Estava ficando claro para mim que eu teria que me livrar desses bajuladores molengas. E, gradualmente descobri seu segredo, um a um. Na maioria das vezes, nos bastidores, bem escondida, estava a mãe. A mãe tomava conta destes gênios, pagava o aluguel, a comida e as roupas.
Lembro uma vez, numa rara saída de casa, eu estava sentado no apartamento desse POETA. Estava um saco, nada para beber. Ele ficou falando que era uma injustiça ele não ter maior reconhecimento. Os editores, todos conspiravam contra ele. Apontou o dedo para mim: “Você também, você disse pra Martin não me publicar!” Não era verdade. Daí, ele começou a reclamar e a se queixar sobre outras coisas. Então, tocou o telefone. Ele atendeu e começou a falar bem baixinho e reservadan’ente. Desligou e virou-se para mim.
“É a minha mãe, ela está vindo pra cá. Você tem que ir embora.”
“Tudo bem, gostaria de conhecer a sua mãe.”
“Não! Não! Ela é horrível! Você tem que ir embora! Agora! Rápido!”
Tomei o elevador e saí. E risquei-o de meu caderno.
Havia um outro. A mãe pagava para ele a comida, o cano, o seguro, o aluguel e ak mesmo escrevia parte dos seus poemas. Inacreditável, E isso aconteceu durante décadas.
AVISO AOS QUE FOREM AO PAÍS DOS LOUCOS


Fique atento aos espelhos. Eles serão menos distorcidos do que nos outros lugares que você conhece.

Não se espante com o que lhe disserem sobre você. Por mais estranho que pareça, será aquilo que eles estão vendo.

Os loucos tem pouco a perder.

As suas reações causarão terremotos constantemente.

Loucos são seres incrivelmente sensíveis. Por menor que seja a pedra, causará muitos círculos quando cair nos lagos desse país.
Ando em silêncio pela casa,
Esperando ouvir um passo teu.

Não choro mais,
Medo de não ouvir bem o telefone,
Que nunca tocou.

De que são feitas estas sombras
No quarto quieto,
Quando a razão já sabe...
Teu corpo está longe,
Luz que se esconde,
Entre as dobras da cortina,
Hoje empoeirada de tentar
Te esquecer.

Essa minha lamentação,
Também passará despercebida.

Talvez alguém me pergunte,
Na repartição, no açougue ou no bar,
Por um certo sorriso tranqüilo,
Que carregava sem saber,
No bolso vazio da calça...

Hoje permaneço em imóvel solução,
Desesperada e calejada
Pelas imensas horas.
Andando em silêncio pela casa,
Ouvindo o passado e a solidão.

Agudizei meu grito, minha doença tão secreta, chama-se...
Como se chama mesmo, Dr. Pinto?
Será que o Senhor poderia falar mais alto? Prá ver se...
Ah, agora sim, consegui acreditar bem melhor.
Mas o Sr. está muito bem Dr. Pinto.
O Sr., como sempre, com a palavra certa.

Agora eu morri numa esquina.
Não teve como dar o outro passo.
Tem um joão-de-barro fazendo ninho na minha coxa.
Agora preciso, urgente, descobrir
se sou poste ou árvore,
água ou louco.

Paciente mente sempre
I

A palavra,
Por muito amada,
É reduzida, concentrada,
Vai diminuindo, diminuindo,
Até que, sumindo,
Vira pum.

O poeta,
Minimalista,
Para,
De boca aberta,
Sem movimento algum,
Admirado desse pum.

II

Pequeninas gotas.
Perfume da florada das macieiras.
Sons do mar.
Submarinos.
Acordando, uma tarde, sem sonho.
Poder gritar.
Casas recém-pintadas.
Comida com alho.
Seda.
Bico do seio.
Nada mais,
Nada mais,
Nada mais.


Voz esganiçada.
Gordura velha.
Falta de roupa limpa.
Silêncio que vem do medo.
Azul e marrom.
Perfume doce demais.
Nunca mais,
Nunca mais,
Nunca mais.

III

Eu queria dividir contigo
Alguns segredos que de vez em quando
Me chutam as canelas.

Mas eles fogem, miseráveis.

E me deixam com esse olhar parado,
Essa boca aberta.
Essa vontade de sumir, e,
Como eles,
Não deixar rastro.

IV

Eu ando emaranhado em milhões de teias,
Tecidas pela indescritível agonia
Do meu coração vazio.

Nenhuma pessoa pode perceber.
Não há nada que fazer.

E continuo tentando.
Nem sei de onde tiro as forças
Para olhar cada dia novo
E não desistir.

Nesse porão que chamo de casa,
Nesse inferno que chamo de vida,
Nesse desencontro que chamo desejo,
Tudo permanece quieto.

Mas, e se por um quase milagre,
Resolvo tentar, droga,
Mais uma vez tentar...

Só aumenta minha desilusão,
Minha dor.
Porque nesse jogo não existem vencedores.

Até quando?

Quem sabe é mesmo um problema de fabricação.
Mas, então, porque haveria o inventor,
De insuflar essa vontade nas suas criaturas,
As mesmas pobres criaturas
Que vagam loucas pela terra?
Por que desejamos tanto amar,
Se somos tão pobres de tudo?

Maldito seja esse senhor.
A Verdade Última sobre os Fatos da Vida.



“O amor não acaba, como as pedras no leito de um rio, mas flui, interminável, como a água que ali passa.”

Para uma amiga de muitos tempos...




Quem ama não precisa de nada,
Nem de ar, às vezes, parece.
Quem ama não precisa de fuga,
Fica tão bem, que de esquecer, esquece.

Quem ama não vê defeito,
Na vida, na arte ou na pessoa.
Quem ama bebe do amor,
E se embriaga, assim, à toa.

Quem ama aceita que a vida,
Seja-lhe um presente todo o dia.
Quem ama nem lembra o que é dor,
Sabe só quando há alegria.

É um ser total,
De tal forma envolvente,
Que ama no outro, igual,
O que a gente não gosta na gente.

Quem ama perdoa, e vê,
Na luz, um pouco mais de claridade.
Quem ama espalha o que sente,
Compreendendo melhor a felicidade.

Porque quem ama, nunca vai embora,
Permanece, no amor, eternizado.
Faz de si, mais anjo que homem,
E tira do coração todo o pecado.

Eu, de te amar, fiz estes versos,
Não serão, com certeza os derradeiros,
Mas que sejam, o marco e a sombra,
De um desses, puros e verdadeiros.

Queira Deus, no Seu infinito silêncio,
Faça-te ouvir o que tenho falado,
Pois não há nada melhor neste mundo,
Que estar feliz ao teu lado.




Nilo Neto
Desterro, 9 de Março de 1999.
De: "niloneto"
PARA: "priscamp"
Assunto: Fim
Data: Quarta-feira, 19 de Junho de 2002 00:09

Se eu te pudesse dizer
O que nunca te direi,
Tu terias que entender
Aquilo que nem eu sei

Fernando Pessoa


Pois assim, sigo caminhando,
sobre um fio que não vejo,
tentando dar sentido
a um velho meu desejo.

Tem dias que sinto tão próxima,
que quase te posso tocar.
Em, outros, saudade sólida,
despositada nesse mesmo altar.

Vens dizer-me, a mim que tenho a atenção
sempre redobrada,
não somos jamais os mesmos,
trilhando uma outra estrada.

Urgia, que me dissesses,
célere e sem titubeio,
se bate apascentado,
o que repousa sob teu alvo seio.

Nesses dias de alguma solidão, se desejada,
para que eu soubesse meu lugar.
Ou se não, espalha teus sinais pela estrada,
para essa nossa distância acabar.

Compreende, minha musa,
e perdoa minha pobre alma insegura,
Manda logo uma resposta,
que essa vida anda tão dura.

Quem assim, tivessa bem certo,
que ama e é certamente amado,
nesses mesmos dias invernais,
e mesmo assim encalorado.

É um homem de muita sorte,
e por mais nada no mundo estrila,
brindado pela encantadora doçura,
do amor de uma certa Priscila.


Nilo Marques de Medeiros Neto

Florianópolis
19-06-02
O homem não é um animal limpinho.
O homem não é o bicho de estimação de deus.
O homem fede, faz barulhos estranhos e
mata outros homens de fome, frio, preconceito e falta de esperança.

Eu sou um homem,
Mas preferia ser outra coisa, bicho ou planta.
Só o homem pode desejar ser outra coisa,
mas nunca consegue deixar de ser homem.
Nascemos com desejos impossíveis.

"Felizes são os peixes" (titãs),
ainda que jamais conheçam a abstração humana
chamada de felicidade.

O homem é filho do medo de deus.
Medo de ficar só.
Cansaço e tédio dos deuses geraram essa coisinha feia, chamada humanidade.

Ou terá sido o contrário?